sábado, 5 de janeiro de 2013

Inclusão da criança com deficiência na escola


Inclusão da criança com deficiência: a mediocridade reina?
Reinaldo Bulgarelli, 05 de janeiro de 2013

Quadro com frase de Osho: "A vida começa
onde termina o medo."
Percebi que uma rede de blogs que tratam dos direitos da pessoa com deficiência se articulou rapidamente para comentar mais um daqueles artigos horríveis da Lya Luft. O artigo está na Veja do final de 2012. Eu não costumo ler estes artigos e “mudo de canal” para não dar ibope a quem não diz coisa com coisa. Se pelo menos buscasse argumentos, informações, mas os artigos dela apenas destilam veneno contra tudo que não seja o pequeno mundinho “classe média”, como ela mesma diz ser.

O intuito aqui não é comentar o triste parágrafo, por exemplo, onde a Lya diz o seguinte: "Segundo, precisamos, sim, rever em toda parte nossos conceitos, leis e preconceitos quanto a doenças mentais. O politicamente correto agora é a inclusão geral, significando também que crianças com deficiência devem ser forçadas (na minha opinião) a frequentar escolas dos ditos 'normais' (também não gosto da palavra), muitas vezes não só perturbando a turma, mas afligindo a criança, que tem de se adaptar e agir para além de seus limites — dentro dos quais poderia se sentir bem, confortável, feliz."

Credo! É confusão demais para alguém que vive chamando os brasileiros de medíocres (“a mediocridade reina, assustadora, implacável e persistente”, em 26 de setembro de 2012, entre outros tantos “artigos”). Mediocridade é querer escrever sobre algo que não conhece, usar sua projeção de maneira irresponsável para destilar seus conceitos medievais como se a caretice nacional nascesse do seu próprio umbigo. Não, dona Lya não vai estragar nosso dia e muito menos os caminhos que escolhemos trilhar. Seus textos medíocres ofendem, ferem a dignidade das pessoas, deixam rastros de ódio e não propõem nada, a não ser que se mantenham as coisas como estavam em mil novecentos e antigamente.

Acho melhor comentar o fato de que a inclusão da criança com deficiência na escola vai seguindo firme e forte. Converso com educadores e dirigentes de escolas públicas e privadas nos seus diferentes estágios de aplicação prática da ideia de inclusão e vejo que as coisas mudaram rapidamente nos últimos anos.

O que era apenas um conceito, hoje pode ser constatado em qualquer escola do bairro de qualquer canto do país. Não, ainda não chegamos lá e muitas coisas precisam melhorar, mas já temos muita coisa para mostrar, muitas histórias para contar e muitos resultados para avaliar.

Com esses educadores que estão trabalhando a inclusão, aprendi que eles superaram algumas posturas e práticas, como as ideias paralisantes, desqualificantes e desmobilizantes (perdoem os neologismos para garantir a rima!):
1. Ideias paralisantes - Elas negam direitos e usam discursos aparentemente críticos para manter as coisas como estão, bem longe das mudanças. Dizem o seguinte: “Enquanto toda a educação brasileira não melhorar, não há porque se falar em educação para a criança com deficiência”. E a criança, todas elas, não têm direito à educação? Tem que esperar tudo melhorar? Quem vai dar o sinal pra avisar que tudo melhorou? Tem cabimento?! Esse tipo de argumento não é o suprassumo do desprezo pelo ser humano? Você ficaria do lado de fora aguardando que alguém, um dia, melhore a escola, segundo os padrões de algum elitista de plantão, para você pisar no tapete vermelho? E enquanto isso, o que faremos?

2. Ideias desqualificantes – Elas acabam com os professores, as escolas e o país e dizem o seguinte: “Os professores são uns coitados, ganham mal, não sabem nem educar uma criança sem deficiência nas péssimas escolas que há neste país pobre e medíocre. A escola brasileira é muito ruim e esses professores desqualificados mal dão conta de suas tarefas básicas.” Os professores ganham mal, a escola brasileira não é a melhor do mundo, longe disso, mas essa moda de desqualificação está mesmo a serviço de quem? Não é o suprassumo do elitismo ficar desqualificando os pobres e quem trabalha com eles? A desqualificação tem ajudado em alguma coisa? Como alguém pode se sentir estimulado se falsos amigos defendem os professores dizendo que são coitadinhos, despreparados e incompetentes? É uma crítica que não quer ver melhoras, mas quer manter o mundinho no século passado.

3. Ideias desmobilizantes – Elas não gostam de participação e não acreditam que os sujeitos da educação poderão se envolver na busca de soluções. Dizem que são todos desqualificados: o povo e seus educadores. Portanto, como irão participar da solução? Apenas os sabidos da pátria, esse povo que nem se informa direito e já sai escrevendo artigos em revistas de grande circulação, é que poderão encontrar soluções interessantes. A vida é melhor do que suas ideias e toda escola que se dispôs a ser inclusiva está enfrentando desafios, evidentemente, mas está também encontrando soluções, construindo uma nova história da educação no país.

Na prática, no concreto, no dia a dia da vida como ela é, as escolas inclusivas entenderam que não estão fazendo mais do que a obrigação, que estão corrigindo uma injustiça gerada no passado e isso não vai ser fácil, mas tem que ser possível. E na coragem dos que não querem dormir no século passado, estão aprendendo a incluir na própria prática da inclusão, além de muito estudo, dedicação, busca por apoios dos mais variados. A inclusão é um processo, um movimento, uma busca movida a ideais muito melhores do que aqueles que movem o elitismo pátrio e nada patriótico.

O que mais escuto daqueles que avançaram para fase do fazer e não mais da conversa fiada é que a educação inclusiva melhora a escola toda, aprimora métodos, gera novas visões e práticas. Esses educadores confirmam o que disse o documento da UNESCO sobre educação inclusiva – “DECLARAÇÃO DE SALAMANCA SOBRE PRINCÍPIOS, POLÍTICA E PRÁTICAS NA ÁREA DAS NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS, 1994”.

Se você tem um filho ou filha com deficiência, não se assuste e muito menos se acovarde diante dessa rabugice de uma pessoa da idade média, elitista e preconceituosa. Participe ativamente do movimento por educação inclusiva e coloque todo seu conhecimento sobre seu filho e sua realidade a serviço da escola.

Não espere um mundo pronto, o mundo das coisas óbvias (é um direito e pronto!) porque estamos em fase de construção. Nesta fase, é preciso firmeza de princípios, mas é preciso também postura educativa, construtiva, parcerias para encorajar e não para congelar as mudanças.

Postura parceira, que cobra, que se indigna e tem as mais altas expectativas, caminha junto e quer soluções, não apenas constatar que o mundo é cruel para com a criança com deficiência. E não se esqueça de envolver sua criança. Ela também pode e deve participar desta construção. A tutela mais atrapalha e reforça falas de ódio à diversidade do que ajuda neste momento que estamos vivendo.

Se sua escola jamais pensou no assunto da inclusão de crianças e adolescentes com deficiência, tome coragem, assuma sua responsabilidade e atenda a uma demanda legítima da sociedade internacional, não apenas a brasileira. E pensar sobre isso pode passar pelas fases acima e que precisam ser superadas: a fase das ideias paralisantes (nada pode ser feito enquanto tudo não estiver perfeito), desqualificantes (não sabemos nada, não estamos preparados, as crianças não estão preparadas, o mundo é despreparado e horrível) e desmobilizantes (não vou pedir ajuda, não vou ouvir ninguém, não acredito que professores, alunos e seus pais possam contribuir de alguma forma).

Ouça, dialogue, converse sobre o assunto com outros educadores, conheça as experiências boas e ruins de outras escolas, disponha-se a mudar e a acreditar que é possível, além de ser um dever. Supere-se, vá além de seus limites porque quem está numa escola já faz isso cotidianamente e encontra nos desafios as condições para o desenvolvimento de todos.

Comece 2013 com algo novo para contar em 2014, até um dia em que as Lyas Lufts da vida serão lidas como se leem hoje os discursos dos nazistas, dos que defendem a eugenia, dos escravocratas, dos ditadores, dos elitistas e daqueles que só conhecem o ódio contra as diferenças. Vamos corar de vergonha pelos humanos que um dia fomos ao deixarmos crianças com deficiência do lado de fora da escola regular.

A história será outra e você ajudou a construir um novo momento, difícil, talvez, mas possível, desejável e muito melhor para todos. Não vá atrás dessa gente que odeia por odiar porque o ódio, como dizem os sábios, jamais construiu nada de bom. Tenha a coragem de viver!
1. O artigo da Lya Luft está reproduzido e comentado no site Lagarta Vira Pupa: Tenha estômago porque nem comentei um décimo das atrocidades ali apresentadas: http://lagartavirapupa.com.br/blog/tag/texto-lya-luft-veja-inclusao/

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O mundo está mais delicado e os homens estão em crise

O mundo está mais delicado e os homens estão em crise

Trabalhei intensamente as questões de gênero neste segundo semestre de 2012. Estou cada vez mais preocupado com os homens e gosto de ouvi-los para entender o que está acontecendo. Antes, pareceria piadinha machista dizer que os homens estão ficando para trás, mas o cenário está cada vez mais nítido neste sentido e é preciso agir sobre ele com o olhar da valorização da diversidade.

O olhar da diversidade

Que olhar é esse? É o olhar de quem valoriza a parceria entre homens e mulheres, que não acredita que haja atributos natos ou genéticos para explicar os papéis de gênero, muito menos a divisão sexual do trabalho. Valorizar a diversidade significa gostar de ambientes que sejam tão femininos quanto masculinos. O que se quer não é a superação de organizações masculinas, masculinizadas e masculinizantes (MMM) por organizações femininas, feminizadas e feminilizantes (FFF), mas aquelas que promovem a cooperação entre homens e mulheres como forma de efetiva construção de algo novo, revolucionário, transformador.
Organizações que valorizam a diversidade de gênero não estão apenas buscando oportunidades melhores para as mulheres, mas estão enfrentando o machismo que explica, gera e mantém essa realidade de prejuízos aos homens e mulheres. O machismo mora na cabeça de homens e mulheres, está no ar que respiramos ou no caldo de cultura no qual estamos inseridos. Portanto, nada é automático e tudo é complexo neste mundo das ideologias que podem aprisionar corações e mentes dentro de padrões que nem mesmo interessam aos beneficiados. Para manterem-se majoritariamente nos lugares de poder, os homens se utilizam do machismo para explicar sua superioridade, mas ele causa prejuízos tão grandes que a mais leve reflexão faz perceber sua inviabilidade. O preço é alto demais!
A valorização da diversidade de gênero, no sentido de melhor distribuição do poder, das oportunidades, dos recursos, da promoção do diálogo, da troca e parceria, parece ser um antídoto melhor do que apenas matar os homens ou dar o poder às mulheres. E o machismo morreria com os homens ou com as mulheres no poder? Haveria mudanças significativas, mas nada garante que o machismo não sobreviveria com novos contornos.

O machismo é inimigo dos homens e das mulheres

O machismo atua na lógica da dominação, da opressão, da discriminação e submissão de alguém a lugares na sociedade com base no sexo com o qual se veio ao mundo. A diversidade de gênero diz que todos podem aprender uns com os outros, serem parceiros com suas singularidades e histórias de vida, até mesmo essas construídas num ambiente cultural machista. Gostar da diversidade leva ao equilíbrio, a estruturas caracterizadas pela igualdade, pela justiça, pelo cuidado com a qualidade das relações.
Quem valoriza a diversidade acredita que as pessoas não nascem para isso ou aquilo, mas para brilhar. Não lida com determinantes genéticos, não naturaliza o que é fruto das relações ou das vivências numa sociedade, num determinado tempo e lugar. Valorizar a diversidade é acreditar que aprendemos e que, se somos assim hoje, podemos ser diferentes amanhã. Nada há que nos condene a um futuro assim ou assado em função do sexo com o qual nascemos. Nada há que nos impeça de levar o outro dentro da gente nesta convivência livre do machismo e na qual podemos desenvolver atributos tidos como dos homens ou das mulheres.

A armadilha que o machismo criou para os homens

O machismo não explica, apenas rotula e diz que assim sempre foi e sempre será, naturalizando desde a origem as desigualdades entre homens e mulheres porque ele é superior e ela é inferior. Superior em que e inferior em relação a quê? Ao naturalizar o que é do campo social, o machismo, essa maneira de explicar a realidade de poder, criou uma armadilha para os homens. O mundo atual está mudado e os atributos que conferiam poder aos homens agora não são mais interessantes. Mas, se é a natureza que está determinando os atributos conferidos aos homens, como eles irão realizar mudanças diante de um novo tempo, com novas exigências, um novo contexto? Não podem mudar porque suas atitudes, comportamentos e até competências estão relacionadas à natureza dos hormônios ou dos órgãos sexuais e reprodutivos. Veja que situação!

O mundo mudou?

Vamos ver um exemplo disso. Eu ando perguntando aos muitos homens que encontro nas fábricas o porquê desta concentração tão antiquada. Respondem sempre a mesma coisa: as atividades exigem força. Pergunto uma coisa e respondem outra. A empresa precisa de homens ou de gente forte? Há homens fraquinhos e mulheres fortes, portanto, a resposta não faz sentido. A divisão sexual do trabalho sempre foi injusta, mas ainda está usando argumentos que apodreceram no caminho. Empresas e seus profissionais não estão atentos ao caminho? Podem tropeçar e gerar problemas para os negócios de muitas maneiras se não estão atentos à realidade.
Quando insisto na pergunta sobre o que explica essa concentração exagerada de homens em fábricas, dizem que as causas são históricas. Era assim no começo de tudo. E não pode mudar? Não mudou ainda? Não pode mudar neste instante em que ainda, em 2012, estamos diante de tantos homens? A fala sobre causas históricas é uma artimanha do machismo. Ora ele se utiliza da naturalização das desigualdades e ora se utiliza da história, como se ambas fossem determinantes e imutáveis.
Houve no Brasil profundas mudanças no mundo empresarial. Se pensarmos nos últimos dez anos – 2002 a 2012, muita coisa mudou. Nossas máquinas[1], apesar de antiquadas e de comprometerem até mesmo a produtividade, já não funcionam na base da força faz um bom tempo. Estou falando, evidentemente, destas grandes empresas para as quais presto consultoria, mas podemos generalizar para a maquinaria e processos de trabalho das médias e pequenas também. Não teriam sobrevivido sem essas mudanças.

O machismo desqualifica os homens

Eu digo aos homens que estão se desqualificando ao justificar a presença majoritária deles desta maneira. Não há mais nenhum sujeito musculoso que só serve para carregar peso dentro das fábricas. Tudo está sofisticado, com altas tecnologias e, assim, exigências de escolaridade cada vez maiores para os trabalhadores.
Eu digo aos homens que ninguém está ali por causa da força, seja homem ou mulher. Todos estão ali porque são inteligentes e atendem às exigências deste mundo sofisticado. Devem ler manuais cada vez mais complexos, tomar decisões, fazer parte de processos interdependentes que apenas a força não daria conta de mantê-los ali. Eles ficam todos orgulhosos de si diante deste lembrete.
Acredito, aliás, que não é correto e nem verdadeiro desqualificar os homens para promover a igualdade de gênero. Constatar que todos estão ali porque são inteligentes gera outro entendimento sobre os prejuízos que a discriminação de gênero causa para as mulheres, para o desenvolvimento da comunidade e das empresas. Não é desqualificando os homens que eles poderão perceber seu papel e se engajar na construção de um ambiente de trabalho que promova diversidade de gênero. É o discurso e a prática machista que desqualifica os homens ao reduzi-los a músculos. Raramente se percebe o quanto é desrespeitoso para com os homens dizer que eles estão num determinado lugar porque ali se exige músculos.
Nem é preciso dizer que estas grandes empresas também seguem padrões sofisticados de saúde e segurança. Além de cumprir a legislação, muitas delas estabelecem limites ainda mais rígidos para os processos que exigem carregar peso. Praticamente não há nenhum momento em que alguém carregue mais de trinta quilos. Mesmo que precisassem tanto de músculos fortes, há mulheres que carregam seus filhos por toda parte, carregam sacolas de feira, carregam a dura tarefa de cuidar de uma casa e da família toda. Nisto tudo há pesos muito superiores aos existentes no ambiente moderno dessas empresas.

O pessoal está discutindo gênero no cafezinho?

As empresas e suas fábricas ou unidades com grande concentração de homens estão atrasadas. A lógica da discriminação da mulher nunca fez sentido e hoje menos ainda. Quando vemos o mundo capitalista reunido em Davos[2] discutindo que a inclusão da mulher pode causar impacto positivo no PIB dos países e das suas cidades ou comunidades, percebemos o quanto esta questão está avançando numa velocidade superior a que as empresas estão realizando. Vamos colocar o assunto na mesa de reunião ou continuaremos conversando sobre isso no cafezinho?

O mundo está mais delicado, portanto, o mundo é das mulheres!

Este mundo sofisticado da tecnologia é o mundo da delicadeza. Uso este termo de propósito porque a delicadeza é atribuída geneticamente às mulheres ou aos homens homossexuais. Mas, o mundo está mais delicado nas suas máquinas e nas suas relações. Ser gestor já não se resume a mandar e controlar como antigamente porque os subordinados são outros e querem mais de seus chefes. Há até quem fale em crise de identidade dos gestores[3]. Imagine não colocar esses assuntos nas mesas de reunião?
Trabalhar numa equipe também já não é a mesma coisa de quando começamos a vida profissional, seja você dos anos 60, como eu, ou dos anos 90. Dentro de uma mesma geração experimentamos mudanças tão intensas que admiro as pessoas com mais de trinta anos que estão nas empresas hoje. São sobreviventes ou pessoas que conseguiram realizar mudanças profundas para estar ali. Há os que apenas quiseram se adaptar, mas não sobrevivem muito tempo desta forma. Há os que participam das mudanças e, mesmo com mais idade e enfrentando muitos desafios, estão sobrevivendo num mundo completamente diferente.

Mulher é superior – a constatação

Vivemos tempos de delicadeza nas máquinas e nas relações, ou seja, um mundo para o qual as mulheres estão muito mais preparadas. Foi a educação ou o “adestramento” que recebemos que nos fizeram assim, mas hoje tudo que é atribuído à mulher ou ao mundo feminino está mais valorizado.
Não há uma revista – Você S.A., Exame, Época Negócios, Isto É Dinheiro, entre outras, que não traga matérias sobre como mulher é muito melhor do que os homens. Antes, pareciam querer provar que eram melhores, agora estão explicando como são melhores. Fato consumado.
E são melhores mesmo? Sim, são muito melhores porque têm as qualidades que se encaixam melhor a esta nova realidade. Não fosse o machismo arcaico, os dados da demografia interna das 500 Maiores Empresas do Brasil, por exemplo, seriam outros.[4] A presença majoritária dos homens em cargos de poder e a consequente masculinização do mundo está vivendo seu apogeu e, assim, seu inexorável declínio.

O perfil das vagas parece ter sido escrito para as mulheres

O perfil das vagas está com exigências que dizem respeito ao mundo das mulheres, esse que o machismo criou e que lhes atribui a delicadeza, o cuidado com os outros, inteligência emocional, capacidade de se comunicar, de se expressar, de mostrar sentimentos e lidar com eles… Quem está mais preparado para o mundo da comunicação, da interação, da delicadeza?
Diante deste mundo que se tornou “feminino”, parece que as mulheres são mais adequadas, preparadas, passando com mais facilidade nos testes, entrevistas e processos de seleção. Eles também estão em busca de atributos femininos e passa no teste, “por coincidência”, quem responde melhor ao que foi perguntado para as mulheres responderem. Não é assim que age o machismo para garantir o lugar dos homens? Agora as estruturas, na mesma lógica, se voltam contra eles dizendo que é mera coincidência que elas estejam se saindo melhor e com tendências a ocupar os lugares de poder.

Qual é o problema?

Não é esta a lógica da valorização da diversidade. Gostamos de mulheres, de homens ou de diversidade? Se gostamos da diversidade, e das parcerias, estamos caindo na armadilha de apenas substituir homens por mulheres. Elas, dizem, nasceram para dirigir empilhadeiras, para cuidar dos canteiros de obra, para cuidar do acabamento, das máquinas, da manutenção dos tratores, das equipes, dos conselhos, do comando das empresas. Se elas nasceram para isso, os homens, portanto, nasceram para ficar bem quietinhos no seu canto porque agora não servem mais para muita coisa neste mundo mudado.
É isso que chamo de armadilha do machismo. Os homens não podem aprender nada com as mulheres para que ambos desfrutem deste novo tempo juntos e juntos construam um futuro melhor?  Tudo é nato, portanto, não há aprendizados, as pessoas não mudam, a não ser tomando hormônios… Estamos abandonando os homens ao mesmo tempo em que estamos resistindo a entregar o poder às mulheres na velocidade que a realidade atual exige. Estamos num tempo de vazio e de crise, de transição entre um modelo e outro.

Tempo de realizar escolhas

É tempo, portanto, de escolher se gostamos de diversidade ou de mulheres, neste sentido machista mesmo que lhes confere atributos “naturais” para estar no poder. Os homens pagam um preço alto ao se manterem no poder à custa desta ideologia machista. Parece que agora serão as mulheres que irão pagar o preço com esta virada da seta da superioridade na sua direção. Muda a seta e estamos contentes ou queremos que mude a bussola que determina quem é superior e inferior?
Podemos passar por esta “curvatura da vara” mais rapidamente conversando sobre machismo, diversidade, a realidade atual e suas exigências para todos. Podemos rever nossos conceitos machistas e acreditar que homens e mulheres podem se reinventar para estabelecer parcerias revolucionárias. Essas parcerias de tipo novo podem até mesmo reorientar nossos rumos para um futuro mais sustentável. Se há tantos avanços tecnológicos que prescindem da força bruta atribuída aos homens, há riscos demais para a vida. Tempos de transição e de decisão. Vamos para qual direção? O que você pensa sobre isso?


[1] Revista Exame 1025, de 03 de outubro de 2012 – matéria de capa: “Porque somos tão improdutivos?” – http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/1025/
[2] O Fórum Econômico Mundial se reúne em Davos, na Suíça, e publica anualmente o Global Gender Gap Report – http://www.weforum.org/reports
[3] Revista Você S.A., edição 174, dezembro de 2012  – Matéria de capa: “O chefe em crise” – http://vocesa.abril.com.br/edicoes-impressas/174.shtml
[4] Instituto Ethos/Ibope – Pesquisa “Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maiores Empresas do Brasil e Suas Ações Afirmativas” – http://www1.ethos.org.br/EthosWeb/arquivo/0-A-eb4Perfil_2010.pdf